A arte de domar as DISTRAÇÕES: Lições essenciais da ciência do FOCO e ATENÇÃO

Sabe quando você senta para trabalhar ou estudar e, de repente, sua mente foge? Você começa a pensar no jantar, na última série da Netflix, ou, melhor ainda, naquela cama macia que parece estar chamando seu nome? Se você já se pegou nessa situação, parabéns: você é um ser humano absolutamente normal – e, sim, tão desatento quanto a maioria das pessoas. Mas calma, não estou aqui para te julgar. Vamos juntos tentar entender essa confusão chamada “atenção” e ver o que dá pra fazer para melhorar nosso foco.

Na verdade, foi esse mesmo pensamento que ocorreu ao psicólogo americano Daniel Goleman, depois de mais um dia de trabalho onde ele tentava por tudo finalizar um capítulo importante de seu próximo livro, mas acabava mais uma vez perdendo o foco. Naquele dia ele se preparou muito, ia ser o dia do foco total: café quente ao lado, porta fechada, silêncio absoluto, zero distrações. Tudo parecia perfeito para a concentração. Mas, no exato momento em que começa a escrever, a mente dele decidia divagar: “será que deixarei a cafeteira ligada?” Frustrado, começa de novo, forçando-se a se concentrar. E, por alguns minutos, tudo parece estar no lugar. Mas, de repente, outro pensamento surge do nada: “Preciso responder aquele e-mail agora ou posso deixar para depois?” Ele tenta resistir, mas a concentração vai se desfazendo, como se a própria mente estivesse conspirando contra o trabalho.

Daniel Goleman

E essa situação se repete quase todos os dias. Goleman começava cada manhã com as melhores intenções, determinado a terminar o que eu precisava fazer. Mas, em questão de minutos, a atenção se dispersava entre tarefas, preocupações e pequenos pensamentos. Ele olhava para a tela do computador e se via perdido, como se o controle da própria mente escapasse a cada tentativa de se concentrar.

Foi essa frustração que o levou a questionar o que realmente acontecia. Ele se deu conta de que talvez não fosse o único a passar por isso e decidiu usar sua própria experiência como ponto de partida para entender por que é tão difícil manter o foco, mesmo em ambientes tranquilos? Esse momento de autorreflexão foi o ponto de partida para algo maior. Ele percebeu que não se tratava de falta de força de vontade ou de disciplina, mas compreender como nossa mente realmente funciona. E a partir daí, a pergunta mudou: como podemos aprender a gerenciar nossa própria atenção em vez de lutar contra ela?

No mundo de hoje, manter o foco é quase uma batalha pessoal. Com redes sociais piscando, notificações bombando e a infinita lista de tarefas, prestar atenção em uma coisa só virou um verdadeiro desafio. E nem vou falar do TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade), que é basicamente tentar jogar esse jogo no nível máximo de dificuldade. Mas a boa notícia é que, assim como Goleman descobriu, existe uma saída – e ela não envolve virar monge ou meditar em uma cabana nas montanhas. Então, quer saber como dar um jeito no seu foco? Vamos descobrir juntos.

Por que é tão difícil manter o foco?

Para entender por que focar é tão desafiador, vale a pena explorar como nosso cérebro realmente processa a atenção. Segundo o neurocientista Daniel Levitin, professor da Universidade McGill, no Canadá, e autor do livro “A Mente Organizada: Pensando com Clareza na Era da Sobrecarga de Informações”, o cérebro humano não foi projetado para lidar com tantos estímulos simultâneos. E isso inclui as notificações, o excesso de informações e o ritmo frenético do dia a dia.

Levitin explica que um neurotransmissor muito importante, a dopamina, é responsável por ajudar a manter nosso foco. A dopamina funciona como uma recompensa interna: ela é liberada quando estamos concentrados em algo interessante ou que julgamos importante. Porém, o excesso de distrações e informações modernas acaba sobrecarregando nosso cérebro, limitando essa capacidade de focar de maneira constante em uma única atividade.

E sabe aqueles momentos que parece que nossa atenção tem vida própria e decide ir embora quando mais precisamos? Quando você está “super concentrado” e, em questão de um instante… puff! Estamos pensando no que vamos comer mais tarde ou no novo episódio daquela série.  Pois é, isso tem nome: “piscadelas de atenção”. Imagine que sua atenção é uma câmera de vídeo, mas que, de vez em quando, trava e perde alguns segundos de gravação. Resultado? Você perde uma parte da informação, e sua mente já está em outro lugar.

Esse conceito, também chamado de “lapsos atencionais”, é estudado por Jonathan Smallwood, pesquisador da Universidade de York, no Reino Unido. Ele explica que esses momentos em que nossa atenção desaparece por alguns segundos são, na verdade, uma função natural do cérebro. Ele explica que esses “lapsos” são uma forma que o cérebro encontra de equilibrar o gasto de energia mental, alternando entre foco intenso e divagação. Esse processo de alternância é natural e, em geral, ocorre em várias situações: no trabalho, em momentos de estudo e até durante uma conversa.

Agora, isso se torna ainda mais intenso para quem tem TDAH, ou Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade. Russell Barkley, psicólogo clínico e professor de psiquiatria na Universidade da Virgínia, nos Estados Unidos, contribuiu com estudos detalhados sobre esse tema. Ele aponta que o cérebro de quem tem TDAH apresenta uma regulação diferente dos circuitos de dopamina, o que aumenta a frequência das “piscadelas de atenção”. Mas isso não significa que essas pessoas sejam incapazes de focar. Muito pelo contrário: elas podem, inclusive, entrar em um estado de concentração extremamente intenso, conhecido como “hiperfoco”, quando algo realmente chama sua atenção. Barkley ressalta que esse conhecimento é essencial para desenvolver estratégias que permitam direcionar essa capacidade de hiperfoco para tarefas relevantes no dia a dia.

E se você estiver tentando “focar demais”?

Será que a falta de foco é sempre um problema? Pode parecer estranho, mas a resposta é não. Às vezes, o problema é justamente o contrário: estamos focando demais em uma coisa e ignorando o resto. Imagine que você está tão mergulhado em um projeto que esquece até de comer ou beber água. Alguém já te chamou três vezes e você nem ouviu? Pois é, foco demais também pode ser um problema.

A psicóloga e neurocientista Amishi Jha, autora de um estudo sobre “atenção plena” na Universidade de Miami, explica que nosso cérebro não foi feito para ficar estabelecido em uma única atividade por muito tempo. No estudo, Jha revela que, ao concentrarmos nossa atenção de forma intensa e contínua, gastamos muita energia mental e física. O cérebro começa a “entrar em pane”, como um computador superaquecido. Isso pode nos levar ao que Jha chama de “exaustão atencional”. Em termos simples, significa que a mente fica tão cansada que perde a capacidade de se concentrar em qualquer outra coisa. E como consequência, acabamos ignorando necessidades básicas, como comer ou beber água, e até nos tornamos menos eficientes.

Outro estudo interessante que reforça essa ideia é de Clifford Nass, psicólogo e professor da Universidade de Stanford. Em sua pesquisa sobre “atenção dividida”, Nass observou que, ao concentrar-se em uma única tarefa, as pessoas têm mais dificuldades em “desligar” essa atividade para reagir ao que acontece ao redor. Nass concluiu que nosso cérebro trabalha melhor com “pequenas pausas” entre atividades, porque essas pausas ajudam a preservar nossa energia mental e evitam que fiquemos tão mergulhados em uma tarefa a ponto de ignorarmos tudo à nossa volta.

E aqui, faço uma pausa rápida no texto para lembrar algo que costumo compartilhar com os altos executivos que treino: a importância das pausas ao longo do dia. Pode parecer simples, até óbvio, mas não é nada fácil. Principalmente se você não tem ideia de como retomar o fio da meada ou se sente sobrecarregado pelos estímulos ao seu redor. A grande sacada aqui é que essas pausas, quando feitas de maneira adequada, podem ser a chave para resolver muitos dos problemas de saúde mental e produtividade que vemos nas empresas hoje em dia.

Tomar um tempo para respirar, se desconectar e recarregar as energias não é um luxo; é uma ferramenta poderosa para manter o foco e o bem-estar. Isso, sim, faz uma diferença enorme na produtividade — e na qualidade de vida!

Então, a questão é: como focar de forma equilibrada? Como direcionar nossa atenção para o que realmente importa sem deixar o resto de lado? E aí vai uma boa notícia: a solução é mais simples do que parece.

Segundo Jha, a chave está em praticar o que ele chama de “atenção aberta”. Ao invés de fixar o foco em um ponto específico por muito tempo, essa prática ensina a expandir a atenção, de forma que a mente possa perceber o contexto ao redor sem perder o que é importante. Esse tipo de treino ajuda a melhorar o foco e, ao mesmo tempo, nos mantém atentos ao ambiente, sem nos isolarmos completamente.

Daniel Goleman, aquele da história do começo deste artigo, notou algo semelhante em suas pesquisas. Em seu livro “Foco: A Atenção e Seu Papel Fundamental para o Sucesso”, ele destaca algo que chama de “flexibilidade de foco”, explicando que, quando treinamos a mente para alternar entre foco profundo e uma atenção mais ampla, conseguimos manter um equilíbrio saudável. Para Goleman, é essa flexibilidade que nos permite direcionar o foco para o que é essencial, sem perdermos em detalhes ou descumprirmos outras demandas importantes.

O segredo para um bom foco não está em manter a atenção ininterrupta em uma tarefa, mas sim em aprender a regular essa atenção. Alternando entre momentos de foco profundo e pequenas pausas.

Então uma pausa pode fazer toda a diferença?

Muita gente, quando ouve falar sobre melhorar o foco, logo pensa em meditação. E, sim, isso pode soar meio repetitivo. Mas o que quero trazer aqui é algo bem simples e acessível, que não exige posturas complicadas, mantras ou tentar “esvaziar a mente”- Até porque isso é impossível enquanto estamos vivos. É uma pausa consciente, de apenas 10 minutos, que qualquer pessoa pode fazer. Durante esses 10 minutos, é só se sentar e prestar atenção no seu próprio corpo. Nada complicado: apenas perceba a respiração, o toque da sua pele, os sons ao redor. E, por mais simples que pareça, isso foi comprovado pelos estudos de Amishi Jha: essa técnica realmente ajuda a diminuir os lapsos de atenção – aqueles momentos em que a mente se perde, e você nem percebe.

Com o tempo, essa prática ativa áreas do cérebro que regulam o foco e torna você menos suscetível a distrações. Em outras palavras, ao treinar esses minutos de pausa, você está ajudando o cérebro a manter a atenção de maneira mais consciente e rápida. Dedicar 10 minutos para essa pausa pode, de verdade, mudar a sua relação com o foco. Você não precisa se isolar do mundo ou virar uma pessoa zen – só praticar, no dia a dia, essa pausa para dar um respiro para a mente.

Talvez você esteja pensando: “Isso não é meditação disfarçada?” Sim e não. Claro, tem semelhanças, mas o objetivo aqui é diferente. A meditação tradicional busca tem diversas variações e objetivos diferentes. O que estamos falando é sobre foco prático: dedicar um tempinho do dia para prestar atenção no movimento da mente e no que se passa no nosso corpo, sem impor nenhum julgamento, apenas treinando a nossa percepção. Aqui, a palavra mágica é “interocepção” – um termo chique para dizer que estamos treinando o cérebro a aumentar sua percepção do estado interno. E por incrível que pareça, quanto mais melhoramos essa nossa Interocepção mais nos afastamos da ansiedade, estresse crônico e depressão.

Monitoramento Aberto: expandindo o foco um passo além

Se você quiser ir um pouco além da questão do foco, uma técnica interessante é o “monitoramento aberto” que mencionei anteriormente. Apesar do nome sofisticado, a prática é bastante simples e surpreendentemente traz resultados incríveis. Ao invés de concentrar a atenção em um único ponto, como costumamos fazer, o monitoramento aberto expande a percepção para tudo o que está ao redor, trazendo mais presença e uma percepção mais equilibrada.

Vamos tentar um exercício rápido? Agora mesmo, enquanto lê este texto, experimente ampliar seu foco. Sem mexer os olhos, perceba o que mais existe ao seu redor – o teto, o chão, talvez os móveis, ou até os sons do ambiente. Note a sensação de ter a atenção “aberta” e perceba vários detalhes ao mesmo tempo.

Essa técnica é poderosa porque ativa circuitos diferentes no cérebro, estimulando áreas que ajudam a equilibrar o foco e a presença no momento, além de treinar a sua visão periférica, algo importante para quem quer ler mais rápido. Ao praticar essa atenção expandida ao longo do dia, você ensina o cérebro a transitar entre foco concentrado e percepção ampla de forma natural. Com o tempo, essa prática não só melhora o seu foco, mas também aumenta a capacidade de reagir e se adaptar a tudo o que acontece ao redor, em qualquer situação.

E o melhor? Você pode fazer isso a qualquer momento, seja no trabalho, em uma pausa, ou até em uma caminhada.

E se você não tiver tempo…

Ok, eu já posso ouvir você dizendo: “10 minutos? Eu mal tenho tempo para respirar, quanto mais para sentar e ficar quieto!”. E eu entendo, a vida moderna é corrida. Mas, sejamos honestos: quantas vezes você já perdeu 10 minutos rolando o feed Instagram ou vendo vídeos engraçadinhos no YouTube? Se esses minutos já estão sendo gastos em distrações, por que não aproveitá-los para algo que vai realmente melhorar sua vida?

Essa prática é simples, gratuita e pode ser feita quase em qualquer lugar. E, se funcionar, pode se tornar sua melhor ferramenta para melhorar a atenção e o foco. Não vale a pena fazer?

Outras formas práticas de melhorar o foco

Se depois desses 10 minutos diários você se empolgar e quiser levar o treino de atenção mais a sério, há várias outras técnicas que podem ajudar. Aqui vão algumas sugestões práticas:

Técnica Pomodoro:

Trabalhar por longos períodos pode ser exaustivo, mas a Técnica Pomodoro divide o tempo em blocos mais curtos, o que ajuda a manter o foco sem sobrecarregar a mente. Funciona assim: você escolhe uma tarefa e se concentra nela por 25 minutos, sem interrupções. Quando o tempo acabar, faça uma pausa de 5 minutos para descansar – levante-se, alongue-se, beba um copo de água. Depois de quatro blocos de 25 minutos com 5 minutos de pausa, faça uma pausa mais longa, de 15 a 30 minutos. Esse método não só mantém a mente focada, mas também previne o cansaço mental acumulado, permitindo que você seja mais produtivo ao longo do dia. E no fundo é um treino que tem o foco como pano de fundo, o que você treina de fato é dar pausas ao longo do dia.

Exercícios de Respiração:

Respirar mais profundamente ajuda o corpo a relaxar e direciona a atenção para o momento presente. Experimente este exercício: inspire pelo nariz contando até 4, segure o ar por mais 4 segundos e, então, expire lentamente pela boca também contando até 4. Esse processo de respiração ativa o sistema nervoso parassimpático, que reduz o estresse e melhora a capacidade de focar. Você pode fazer isso antes de uma tarefa importante ou sempre que perceber que sua mente está agitada. A nuance técnica aqui é lembrar que o foco é mais na expiração do que na inspiração. Quando você torna a expiração mais lenta e mantém sua atenção mais presente nesta etapa da do ciclo da respiração você consegue entrar em um estado de calma e foco muito mais rapidamente.

Ainda precisa de ajuda para entender o que fazer? Então aqui vai um vídeo que vai te ajudar. É só dar o PLAY e seguir o que está se passando na tela. FÁCIL!!!

Movimente-se:

Às vezes, a melhor maneira de melhorar o foco é se movimentar. Estudos mostram que a atividade física aumenta a oxigenação no cérebro, o que, por sua vez, ajuda a melhorar a concentração. Não precisa ser um treino intenso; uma simples caminhada de 10 a 15 minutos já ajuda. Caminhar ao ar livre, por exemplo, proporciona uma pausa mental e permite que você retorne à tarefa com mais clareza e disposição. É uma prática excelente para quando você se sente cansado ou “travado” mentalmente.

Priorize o Sono:

Tentar se concentrar sem dormir bem é como correr com uma pedra pesada amarrada na perna – seu desempenho vai ficar muito aquém do que poderia ser. Durante o sono, o cérebro processa informações, fortalece a memória e se recupera para o próximo dia. A recomendação para a maioria dos adultos é de 7 a 9 horas de sono por noite, e a qualidade do sono também conta. Experimente dormir em um ambiente tranquilo e escuro, sem aparelhos eletrônicos, e tente manter uma rotina regular. Afinal, um cérebro descansado é uma base para um bom foco e uma atenção sustentada durante o dia.

E então, preparado para focar?

Agora, talvez você veja a atenção de uma maneira completamente diferente. Não se trata apenas de “tentar focar mais”, mas de compreender o funcionamento natural da nossa mente e encontrar formas práticas de trabalhar com ela, e não contra ela. Cada atividade, seja uma pausa consciente de 10 minutos, monitoramento aberto ou pequenas estratégias diárias de foco, como exercícios de respiração, é uma oportunidade para cuidar – ou melhor, treinar – a sua capacidade de concentração.

Transforme esses pequenos ajustes em hábitos diários e fortaleça seu foco de forma gradual e sustentável. Pense no impacto que uma atenção mais consciente e flexível pode ter em cada aspecto da sua vida – no trabalho, nas relações, e na sua saúde mental. Esse equilíbrio entre foco profundo e atenção expandida não é um truque, mas um caminho para se sentir mais presente e com maior percepção da realidade que está à sua frente.

No fim do dia, o que realmente importa é o quanto estivemos presentes com o que estava acontecendo diante de nós, em vez de nos perdermos em pensamentos aleatórios, rolando o feed das redes sociais ou fantasiando um futuro que pode nunca se concretizar. Foco no presente e você certamente colherá todos os benefícios que isso pode trazer.

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